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O Pesadelo

| terça-feira, 29 de maio de 2012 | |

O senhor Onofre sonhou com o dr. Reis toda a noite; onde este o perseguia com os outros heterónimos e lhe gritava impropérios e o insultava furibundo. Uma descompostura nunca vista, uma humilhação ímpar. Que mal teria ele feito ao poeta, pois se mal se conheciam.
Abriu a janela do quarto e sentiu o ar de maresia encher-lhe a casa. Sentou-se à secretária antes da quebra do jejum e escreveu sem tino:

Vem deitar-te comigo Lídia, à beira mar.
Massaja-me as têmporas de ressaca que eu lambo-te as feridas abertas.
O mar molha, de cima abaixo o corpo já de si húmido, salgado.
Deixa o tempo passar Lídia, à beira mar, como se o tempo não passasse.
Só existe um tempo à beira mar, Lídia, Agora.
Vem deitar-te, Lídia, e esquece-te comigo
descomprometida da história, da vida e de tudo.

Não era uma homenagem ao poeta, nem sequer uma qualquer forma baixa de plágio. Era vingança apenas, da pura: não se persegue um homem assim; uma noite inteira, aos gritos.

6 comentários:

luisa Says:
29 de maio de 2012 às 22:39

É bem feito... Grande Onofre! :)

El Matador Says:
29 de maio de 2012 às 22:58

;)

mz Says:
31 de maio de 2012 às 23:19

A vingança é a Lídia ou a poesia?

El Matador Says:
31 de maio de 2012 às 23:21

é a poesia.

Briseis Says:
1 de junho de 2012 às 11:29

Ai... eu adoro, ADORO poesias com nome de mulher...mesmo que o nome não seja o meu. E um poema saído assim do desatino de uma noite insana tem o seu quê de irresistível! =)

El Matador Says:
1 de junho de 2012 às 11:54

ehehe, o poema é um "assassínio" literário propositado de um outro de Ricardo Reis "Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio".