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Como o Sódio Sem Cloro

| sexta-feira, 21 de dezembro de 2012 | |

“Estamos sós e sem desculpas. É o que traduzirei dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre porque, uma vez lançado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer.”
J.P. Sartre

Sei que estou nu e ainda assim apresento-me a tribunal. Entrego-me à mercê dos meus pares no estado em que vim ao mundo: transparente e impoluto. Sem mágoas, sem apelos, sem agravos. Sou tudo o que está à vista. Assumo a tremenda estupidez, arrogância e inépcia de me comportar como um ser pertencente à humanidade. Não valho nada, estou consciente e em paz. Conhece-te a ti próprio, alvitram as filosofias; é isso que faço: conheço-me a cada dia que passa e a cada dia sinto mais asco daquilo que sou: um verme vermelho e verde, uma viscose daninha, um vírus vaidoso. Mea Culpa por tudo o que fiz e por tudo o que ainda virei a fazer. É muito importante prevenirmo-nos de pessoas como eu, Meritíssimo. Se me deixam a sós e sem supervisão, isto é, se me deixam tomar decisões baseadas no livre arbítrio, então declaro ser um individuo perigoso. Não sou fiável admito, sou cruel e traiçoeiro; sou instável como o sódio sem o cloro; mereço o cadafalso, uma guilhotina que me apazigúe, digníssimos.
Um dia saí à rua e fui mau porque pude, e essa foi a mais forte das drogas que já tomei, também a mais viciante.
Não tenho medo de deus, senhor doutor, tenho medo de mim; é que, sabe senhor doutor, de mim eu já senti as dores, deus nunca vi.
Por esta altura um meirinho fustiga-me os genitais com uma vara de bambu, só para ver se ainda funcionam uma vez que se dependuram ressequidos. Ai! Exclamo deveras incomodado, a madeira quando ofende as partes pudibundas tende a ser dolorosa, e lá está, as dores eu sinto.
É um facto que está vivo, declara o Supra Sumo Supremo Meritíssimo. É um facto que é culpado. Deverá portanto ser exposto como exemplo. Atirem-no pela janela besuntado de mel, depois soltem as vespas.

3 comentários:

Anónimo Says:
22 de dezembro de 2012 às 20:05

porra... quanto mais dolorosos, melhores ficam.

este poderia ser o inicio de um belo livro, EM...

hesseherre Says:
23 de dezembro de 2012 às 22:20

Em 2012 me indicaste o PhotoScape e te agradeci. Estás na vitrine do meu blogue e não poderia deixar de passar aqui para te abraçar e desejar tudo de bom em 2013 e Um Feliz Natal.
Sergio Rebouças

Briseis Says:
24 de dezembro de 2012 às 00:17

Como invejo a tua temeridade...
Inveja daquela má, daquela que é pecado...